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domingo, 29 de março de 2020

Escrito por em 29.3.20 com 0 comentários

A barra que eu gosto de segurar

Hoje, infelizmente (primeiro porque não teremos mais textos maravilhosos, segundo porque vou ter que voltar a escrever os meus), terminaremos o Mês da Mulher no átomo. Mas terminaremos em grande estilo, com um texto da espetacular Rose Carreiro, "aspirante a pole dancer, agente de viagens dedicada, cronista cotidiana, pseudo-erótica e Murphyana de carteirinha", minha mais recente amiga de infância, a moça que me convenceu a escrever pro Crônicas de Categoria, e autora também do Curvas Imaginárias (NSFW, teje avisado se quiser clicar).





A barra que eu gosto de segurar

Quando fui convidada pelo Guilherme para escrever como convidada neste estimado blog, não tive dúvidas sobre meu tema: já li aqui textos sobre artes marciais e esportes, e decidi trazer a minha atividade física favorita para este blog - o pole dance. Até cheguei a pensar em introduzir o assunto à la átomo, com a origem e tudo o mais, mas a Wikipedia tá aí pra isso, neah?! Então, seguindo meu coração, e como boa discípula e pole dancer, eu vim aqui evangelizar e dar meu testemunho sobre como essa barra me transformou.

Para quem não conhece o universo do pole, adianto que nem tudo é rebolar a bunda e girar em torno do poste. Além da dança - e aí há o pole dance e o pole exotic, que envolve movimentos mais sensuais, floorwork (quando a gente fica se contorcendo no chão) - há também o esporte. Sim, o pole foi reconhecido como esporte pela GAISF (Global Associaton of International Sports Federation), e pode até entrar para as modalidades olímpicas.

E como eu fui parar nesse mundo? Bem, digamos que eu era uma pessoa expansiva e, por motivos que não cabem aqui, eu me fechei. Me repreendi. Era uma pessoa encolhida, aos trinta anos me achava velha pra usar certas roupas e fazer certas coisas. E estava conformada de que a vida era isso. Mas, depois de sofrer muitas mudanças pessoais, perdas, e de desistir de manter a corrida como atividade física que não me agradava e que me deixava mais cansada do que satisfeita, decidi encarar o pole. Vi e li depoimentos, e acabei convencida por este vídeo da Jout Jout. Tudo que ela relatava no pole era do que eu precisava.

Então, lá estava eu, num Janeiro escaldante, aos então 34 anos, de regata e shorts de corrida, tentando aprender meus primeiros giros. E falhando miseravelmente, é claro. Mas cada aula vinha com muitas lições sobre limites, persistência, e principalmente, sobre paciência. Não desisti, muito graças às minhas professoras maravilhosas, e muito também às amigas que fiz - e que hoje são minhas pole friends, e com elas eu faço pole street, pole market, pole porre... porque a gente vira uma comunidade das pessoas que gostam de trepar nos postes por aí e dividir a vida entre uma sessão de alongamento e outra.

O pole me ajudou a me enxergar melhor. Com tanto tempo em frente ao espelho, e com tantos exercícios que exigem consciência corporal, a prática me ajudou a ver detalhes meus - e aceitá-los de uma forma que eu nem sabia que poderia. E aí vem a questão da autoestima. A gente começa a ficar com o corpinho mais durinho, se vê mais bonita, aprende o body wave e boom. Porque o pole envolve, sim, sensualidade, e quando a gente consegue fazer um movimento sem parecer que vai partir as costas e se entrega à dança, sensualizar vira uma coisa natural. Daí, é só ladeira abaixo. Ou pole acima.

Para quem pensa em experimentar o pole dance, mas tem medo de não conseguir, ou acha que idade / tipo físico / peso / histórico sedentário são limitadores, eu, no auge dos meus 35 e me sentindo melhor do que aos 25, garanto que não. Os instrutores vão saber lhe guiar, lhe ajudar a entender o seu processo e suas limitações, e a evolução pode demorar, mas ela acontece. O preconceito sobre a prática existe? Sim. Quando contei pra minha mãe que tinha começado as aulas, ela quis saber se eu ficava num palco com gente em volta assistindo. Sem contar que todo mundo achava que eu estava fazendo pole para dançar pro conje. Ele nunca viu uma performance minha. Se você quer praticar pole dance, ou qualquer dança que envolva sensualidade, faça. E faça por você. E considere que nada é impossível. Você, no seu tempo, com sua evolução pessoal, trabalhando as suas questões. Mas não deixe de tentar. O pole mudou a minha vida, e pode mudar a sua.
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domingo, 22 de março de 2020

Escrito por em 22.3.20 com 0 comentários

Detox Pessoal

Hoje temos mais um texto do Mês da Mulher no átomo, e quem contribui com uma valiosa dica é a sensacional Pati Librenz, "aspirante a minimalista, revisora de textos e pesquisadora de literatura (em férias dessa função por prazo indeterminado)", que também escreve no Crônicas de Categoria (aliás, se você não conhece, dá um pulo lá, não vai se arrepender).





Detox Pessoal

Nas minhas duas últimas mudanças, eu levei muito tempo para colocar minha casa em ordem, por causa da quantidade de coisas desnecessárias que eu vinha acumulando ao longo dos anos e, muitas delas, eu nem usava mais. Algumas, admito, comprei por impulso; outras, até faziam sentido na época em que foram adquiridas, mas agora já não fazem mais. Fiz um detox na biblioteca, na cozinha, na lavanderia e no guarda-roupas. Resultado: mais de 2 mil reais recuperados com coisas que estavam entulhando a casa. Percebi que é possível, sim, ser feliz consumindo menos e que o clichê "menos é mais" não é tão clichê assim. E então a mágica acontece: sobra dinheiro no final do mês e espaço dentro de casa!

Mas a melhor decisão que tomei, foi, de longe, a do detox pessoal. A gente não acumula apenas objetos desnecessários, mas relacionamentos desnecessários. O resultado disso é que, muitas vezes, acabamos colecionando relações tóxicas e abusivas. Sabe aquela pessoa que não te acrescenta em nada e que só suga suas energias? Desapega!

O relacionamento abusivo não é exclusivo de relações amorosas; existem amizades abusivas também. Era exatamente o caso. Mas, como o nível de maturidade e autonomia dessas pessoas (era um casal, só para ficar claro) era muito abaixo da média mundial, não se tratava de uma relação que eu conseguiria ir cortando aos pouquinhos - e eu sequer teria paciência para isso (até porque paciência, definitivamente, não é o meu forte). O mal teria que ser cortado pela raiz, pois eu decidi que não entraria em 2020 com essa questão pendente. Eu estava carregando um fardo que não era meu, tentando resolver problemas que não me diziam respeito e que consumiam um tempo que era precioso demais pra mim.

Foi então que, em uma conversa com uma das minhas melhores amigas, ela sugeriu que eu escrevesse uma carta ao casal. E foi exatamente o que eu fiz: eu terminei uma amizade por "cartinha", enviada pelo WhatsApp. Conforme informado (e devidamente justificado) na "carta", bloqueei os dois no aplicativo e desfiz as amizades no Facebook. Eu devia satisfações? Não! Mas achei prudente, para evitar visitas indesejadas em minha casa. Não os bloqueei nas redes sociais porque não julguei necessário. Porém, alguns dias depois, percebi que eu estava enganada - deveria ter bloqueado em tudo. Recebi um recado no Messenger me pedindo pra reconsiderar a decisão. Sabe aquele papo de namorado arrependido? "Ah, eu errei mesmo, mas eu juro que vou mudar, me dê mais uma chance!" - a sirene de alerta soou e eu saltei longe. Mas como de comportamento de abusadores eu entendo, sequer me dei o trabalho de responder e a pessoa foi bloqueada no Facebook também.

Infelizmente, nós, mulheres, temos a tendência em manter e tolerar demais esse tipo de vínculo, porque, em algum momento das nossas vidas, aprendemos que precisamos ser amáveis e agradar todo mundo - e, não, nós não somos obrigadas a ser legais o tempo todo! Principalmente com quem não nos faz bem. Eu passei anos acreditando que eu tinha a obrigação de acolher a todos com seus problemas, tanto que cheguei a um ponto em que eu, que escolhi não ter filhos, estava praticamente tendo que educar e ensinar coisas básicas a dois marmanjos. Hoje, estou há quase três meses sem nenhum contato com essas pessoas e, a cada dia, sinto-me melhor, mais leve e com mais tempo para pensar em coisas que são realmente importantes e produtivas para o meu crescimento pessoal.

Então, caso você conviva com alguém que não te faz bem, que te puxa pra baixo, lembre-se: você não é obrigada(o) a aturar essa pessoa. Não importa se é alguém na família, se é um amigo de longa data ou se é alguém do trabalho com quem você seja obrigado a falar diariamente: você sempre pode escolher cortar quem quiser da sua vida pessoal. E corte mesmo quem não te faz bem! Sem dó. Porque essa pessoa também não tem dó de ti.
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domingo, 15 de março de 2020

Escrito por em 15.3.20 com 0 comentários

Acabou, mas, se apertar, ainda tem

Hoje damos prosseguimento ao Mês da Mulher no átomo, com um lindo texto da fantástica Deise Duarte, autora do livro Do Quinto Andar, que se define da seguinte forma: "Deise Duarte é uma carente emocional em recuperação. Nasceu em Criciúma-SC nos anos 80 e cresceu com olhos grudados na Coleção Vagalume. É apaixonada pela vida, por sua playlist e acredita nas pessoas. Escreve diário, blog, lista de supermercado e cartas de amor". E escreveu esse belíssimo texto especialmente para o átomo:





Acabou, mas, se apertar, ainda tem

Às vezes eu olho pra gente e penso que acabou, mas lembro do creme dental que você queria jogar fora e eu apertei mais um pouco, fazendo durar por duas semanas, e acredito que, se apertar o amor da gente, ainda tem!

Lógico que não é pra apertar tanto que se rompa a embalagem, é só apertar com jeitinho pra aproveitar tudo o que presta, porque não se deve desperdiçar o que é bom. Se está em perfeita condição de uso, deixar de aproveitar por desleixo é inaceitável pra mim. O creme dental está ali e é só olhar com atenção pra ver: parece que acabou, mas, se apertar, ainda tem.

Assim é a nossa relação.

Parece que ela acabou quando brigamos pelas roupas que ficaram pra dobrar em cima do sofá, ou pela água que eu não comprei, ou pela bronca que eu te dei no trânsito, e só consigo pensar que acabou quando nos enxergo como um casal medíocre que briga porque não consegue orquestrar a rotina da casa, mas, no meio da rua, sua mão segura na minha e você me pede pra não desistir da gente, e eu penso que, se apertar, ainda tem.

No meio de uma discussão porque você não vem logo pra cama eu tenho quase certeza que acabou, mas quando acordo com sua mão na minha cintura e seu nariz mergulhado no meu cabelo numa manhã qualquer eu acho que, se apertar, ainda tem.

Enquanto eu grito que acabou e você em um tom baixo, me pede calma e com olhos carinhosos diz para eu te escutar, sinto que está apertando com todo o cuidado e com toda a força, porque sabe que, se apertar, ainda tem.

Quando sentamos dispostos a conversar sobre a nossa relação é porque acreditamos que ela ainda existe. Ela é nossa. Ela não acabou.

Ninguém compra nada novo porque acredita que, se apertar, ainda tem.
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domingo, 8 de março de 2020

Escrito por em 8.3.20 com 0 comentários

Sobre Filmes e Significados - O Que Importa Para Você?

Se você não passou por aqui semana passada, talvez não saiba que, em homenagem ao mês da mulher, eu decidi fazer um, bem, Mês da Mulher, convidando cinco das minhas maravilhosas amigas para que cada uma escrevesse um texto e abrilhantasse meu humilde blog com sua presença. Hoje é dia da extraordinária Márcia Neiva, que, em suas próprias palavras, é "cientista e professora, há alguns anos resolveu ser também bailarina. Acredita que, apesar de tudo, a vida é supimpa, e tudo melhora com uma boa música, filme, livro ou viagem. Não escreve oficialmente em nenhum blog, mas de vez em quando gosta de dar uns pitacos sobre a vida, o universo e tudo mais, num pequeno espaço da internet ou tomando uma boa cerveja na mesa de um boteco, o melhor lugar para filosofar". Filosofemos com ela, então!




Sobre Filmes e Significados - O Que Importa Para Você?

Comédia romântica é um tipo de filme frequentemente tido como de segundo escalão, "água com açúcar", "filme de mulherzinha", e que por muito tempo eu tive vergonha de admitir que gosto muito. Hoje eu vou falar de duas das minhas comédias preferidas, para mostrar que esse tipo de filme, tão renegado, pode trazer histórias que mexem com a nossa vida, e podem trazer sentimentos intensos e até aprendizados sobre nós mesmos, basta um olhar diferente.

Não é pelo romance, não vou focar nisso, esqueçam essa parte porque é óbvia, mas porque, dos filmes que gostei, sempre consegui ter revelações ao me identificar com as personagens. E, pessoalmente, não entendo de técnica de cinema, então para mim o que vale é a mensagem e como me sinto ao ver os créditos finais passarem pela tela.

Mesmo Se Nada Der Certo
Begin Again
2013


Conta a história da britânica Greta (Keira Knightley), cantora e compositora talentosa, mas que não acredita muito no seu talento e meio que se anula à sombra do namorado, também cantor. Em uma viagem a New York acompanhando o namorado, que está começando a fazer sucesso, ela descobre que foi traída, o abandona e se pega sozinha em uma cidade estranha onde só tem um amigo. Então ela conhece Dan (Mark Ruffalo), um produtor musical decadente, que enxerga seu talento e a convida para gravar um disco. O filme é muito bom, o tipo de musical que eu gosto, com a sacada ótima de gravar as músicas na rua ao ar livre, além de eu adorar a Keira Knightley e o Mark Ruffalo. Mas o marcante para mim foi me identificar com a Greta e com o processo de descoberta de si mesma que o rompimento provocou, pois eu estava ali passando pelo mesmo processo. De sozinha e literalmente na merda sem nada, ela conheceu uma pessoa que também não vivia seus melhores dias, e juntos viveram momentos que a fizeram redescobrir seu talento e sentir que não precisava viver à sombra de ninguém. O legal é que não temos exatamente um romance entre os dois, mas uma amizade que nasce entre duas pessoas vivendo momentos difíceis, e que juntos conseguem se reerguer. Mas o mais importante que esse filme me trouxe foi o sentimento de liberdade, no momento exato em que ela descobre que está tudo bem em ficar sozinha, e que ela não "precisava" mais de quem achava que não viveria sem.

Sim, esse momento foi uma epifania para mim, e a partir desse filme eu também comecei a "dar a volta por cima", e hoje nem sei como pude gostar tanto de um... bem deixa pra lá!

Casa Comigo?
Leap Year
2010


Esse filme já seria por si só especial, por ser filmado na Irlanda, país que eu amo, e ver alguns dos cenários por onde passei me traz uma saudade deliciosa, mas não é só isso. Nele, a gente vê a história de Anna (Amy Adams), uma mulher que vive uma vida planejada nos mínimos detalhes, não gosta de surpresas, mudanças ou imprevistos. Ela tem o namorado perfeito, rico e bem sucedido, mas que parece estar "enrolando" e não faz um pedido de casamento que ela tanto esperava. Após a decepção, sabendo de uma antiga tradição de seus antepassados irlandeses, ela parte pra Dublin para encontrar o namorado, que está em viagem de trabalho, e pedi-lo em casamento no dia 29/02 – o leap day, que só ocorre em anos bissextos - já que, segundo a tradição, ele não poderia negar um pedido feito nesse dia. Acontece que nada sai como ela havia planejado, e por conta do mau tempo (Irlanda, né?) ela vai parar no interior da ilha, no meio do nada, onde conhece Declan (Matthew Goode), um irlandês grosseirão o qual contrata para levá-la a Dublin. Claro que previsivelmente eles se apaixonam, mas não foi isso que me conquistou na história. A mensagem que ficou para mim é que eu era como a Anna, planejei a minha vida nos mínimos detalhes, não gostava de mudanças e tinha medo de sair do "script". Ao final, ela descobre que conseguir tudo o que queria, não o que precisava, não a fez feliz. Comigo também nada saiu como planejado, e apesar de infelizmente não ter sido por causa de um bonitão irlandês (ai meu Deus, Matthew!), assim como ela, eu descobri que não planejar pode ser bom, e quando as coisas dão errado, às vezes, ou diria quase sempre, te levam ao lugar certo.

Você pode não ir aonde pretendia, mas provavelmente vai chegar aonde deveria estar, hoje eu sei lidar muito bem com mudanças, aliás adoro e sou muito feliz, só falta o irlandês.

Enfim, eu poderia continuar aqui falando de filmes assim por páginas e páginas, mas creio que o melhor é assistir, então vejam, tirem suas conclusões, e quem sabe voltem para o título desse texto: e aí, o que importa para você?
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domingo, 1 de março de 2020

Escrito por em 1.3.20 com 2 comentários

Roteiristas

Minhas amigas são as melhores do mundo e eu posso provar. Aproveitando o enorme sucesso do Mês dos Convidados (medido pelo fato de que eu passei um mês inteiro sem precisar escrever um post), que aconteceu em maio do ano passado, pensei em fazer um segundo mês temático esse ano, mas, como mês temático repetido é proibido, tinha que inventar alguma diferença em relação ao anterior. Como todo mundo sabe, março é o Mês da Mulher, então pensei "por que não convidar quatro (depois descobri que teriam de ser cinco) das minhas extremamente inteligentes e competentes amigas para agraciar o átomo com seus textos?". O resultado dessa indagação vocês verão a partir de hoje e ao longo de todo esse mês, quando ocorrerá o Mês da Mulher no átomo - durante o qual vocês poderão comprovar que eu não menti no começo dessa introdução.

Para começar o Mês da Mulher, trago-vos um texto da fabulosa Letícia Nascimento, jornalista e roteirista, que escreve no Trópico de Capricórnio e em nosso querido Crônicas de Categoria. Hoje é dia de roteiristas no átomo!





Com tantas possibilidades de assuntos para explorar neste blog, que abrange tantas coisas que eu amo - como jogos de tabuleiro, literatura e séries de TV - resolvi escolher o cinema, mais especificamente, uma vertente dele que também faz parte direta da minha vida, roteirista (nas horas que o proletariado permite) que sou.

Para aproveitar o Mês da Mulher, resolvi falar sobre roteiristas mulheres, nós que ainda temos estatísticas desiguais na indústria, por mais que os números melhorem a cada dia. Mesmo que a maioria das pessoas nem saibam o nome dos roteiristas dos filmes que assistem no cinema, ou os autores daquele episódio de série viciante, o trabalho do roteirista é parte essencial de uma produção.

E como uma mulher que dirigiu dois curtas-metragens, tirando meus personagens do papel e os levando para uma tela grande, algo que me dá um orgulho danado, tenho ainda mais consciência de como o espaço para as roteiristas e diretoras ainda está anos-luz de ser o ideal. Por exemplo, enquanto escrevo este texto, o corretor sublinhou em vermelho a palavra "diretoras" e "Did you mean: diretores". Temos um longo caminho pela frente.

Por sorte, há aquelas que chegam lá. Que conseguem seu espaço nas produtoras, exibem em grandes festivais, chegam ao Oscar e tudo mais. Não sem antes passar por uma enxurrada de machismo e alguns obstáculos que não estavam ali para os seus colegas. E quando falo de machismo, falo de olhos fechados, porque é muito raro conhecer uma mulher que não o tenha vivenciado na própria pele. Nós convivemos tanto com o machismo que às vezes nem conseguimos identificá-lo.

Eu passei por alguns episódios no meio audiovisual da minha cidade. Um diretor disse que adoraria que eu trabalhasse em um set seu, o que me deixou instantaneamente feliz, e na sequência disse "pena que só temos vaga na produção", ao que eu prontamente respondi "sem problemas", e ele, rindo com um outro cara ao lado: "mas tem que carregar peso, você não dá conta". Mal sabe ele quanto peso carreguei sorrindo no set dos meus dois curtas. Essa fala e as risadas me afastaram para sempre de trabalhar com este homem, que me procurou depois para que eu fizesse parte de sua equipe. Aqui não!

Outra coisa recorrente era chegarmos para filmar e qualquer pessoa achar que um dos meus assistentes (homens) dirigiam o filme e não eu. O pedido de silêncio do meu assistente também era ouvido com mais respeito do que o meu. Ao final do dia, as coisas aconteciam, mas sempre com uma sensação de insuficiência do lado de dentro do meu peito. Ao final do meu segundo filme tive que ouvir de um homem como ele estava surpreso por eu ter conseguido dar conta de fazer aquilo. Como se ele estivesse esperando o tempo todo pelo meu fracasso. Isso, inclusive, contribuiu para me afastar de vez da direção, mas isso é assunto para outra conversa.

Para não ficarmos apenas no mundo das lamentações, vou tornar este texto mais efetivo sugerindo alguns filmes de roteiristas incríveis, que estão dando a cara à tapa na indústria, muitas vezes dirigindo os seus próprios roteiros. Eu não gosto de sinopses - pois é - então vou apenas indicar filmes maravilhosos, para todos os gostos. Assim como na literatura, fica meu apelo: assista filmes escritos e dirigidos por mulheres. Nós somos tão boas quanto eles.

E que tal começar a reparar nos créditos das produções que você consome? Veja quantas mulheres aparecem e a minha necessidade de falar sobre isso e de colocar você para pensar nisso vai fazer mais sentido, pode apostar.

O Lixo e o Sonho (Ratcatcher, 1999) - Lynne Ramsay



As Virgens Suicidas (The Virgin Suicides, 1999) - Sofia Coppola



Que Horas Ela Volta? (2015) - Anna Muylaert



Zama (2017) - Lucrécia Martel



Tomboy (2011) - Céline Sciamma



Outros filmes que foram escritos por mulheres e você nem desconfiava:

Metrópólis (Metropolis, 1927) - roteiro de Thea von Harbou, direção de Fritz Lang


E.T. - O Extraterrestre (E.T. the Extra Terrestrial, 1982) - roteiro de Melissa Mathison, direção de Steven Spielberg


Thelma & Louise (1991) - roteiro de Callie Khouri, direção de Ridley Scott


Hiroshima, Meu Amor (Hiroshima, Mon Amour, 1959) - roteiro de Marguerite Duras, direção de Alain Resnais


Garota Exemplar (Gone Girl, 2014) - roteiro de Gillian Flynn, direção de David Fincher
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domingo, 26 de maio de 2019

Escrito por em 26.5.19 com 0 comentários

Juntos e Shallow Now

Hoje, infelizmente, termina o Mês dos Convidados, durante o qual quatro amigos meus escreveram e eu fiquei de boinha só publicando. Como o blog é meu, creio que não seria uma boa continuar com isso indefinidamente, até porque eu nem conheço tanta gente assim, então semana que vem o átomo retorna à sua programação normal. Mas, antes disso, ainda dá tempo para mais um.

A convidada de hoje é a que, dos quatro, há menos tempo é minha amiga – nos conhecemos a quê, uns cinco, seis anos? - mas mesmo assim ela foi uma das primeiras pessoas nas quais eu pensei quando tive essa ideia – e, se você conhece o Crônicas de Categoria, sabe o porquê. Senhoras e senhores, hoje é dia de Mayara Godoy no átomo!




Por que odiamos Juntos e Shallow Now

Como se 2019 já não estivesse desgraçado o suficiente, a Paula Fernandes e um sertanejo universitário cujo nome não me lembro - e não me importo o suficiente para pesquisar - lançaram uma versão brasileira da música Shallow, composta por Lady Gaga e interpretada em parceria com Bradley Cooper no filme Nasce uma Estrela.

A canção original foi, inclusive, agraciada com um Oscar, e rapidamente passou a tocar incansavelmente mundo afora. É claro que, aqui no Brasil, não ia demorar para surgir uma versão, afinal, estragar músicas alheias que fazem sucesso é quase uma tradição do meio artístico de nosso país - tradição, esta, "cuja qual" sou contra, salvo raríssimas exceções.

Eis que, então, a dupla citada lá em cima, Paula Fernandes e Sei Lá Quem, divulgam um trecho da música, tipo um spoiler, só para dar aquele gostinho, sabe? E o gostinho foi amargo. Não amargo como uma boa IPA. Mas amargo como um limão estragado mesmo.

Eu nem preciso entrar em detalhes porque, provavelmente, você também já teve a infelicidade de ouvir essa aberração, mas vim aqui dizer por que achei a "composição" tão odiosa.

Não é só porque eu não gosto de versões. Também não é só porque eu não gosto da Paula Fernandes e dos sertanejos universitários em geral. Também não é só porque a frase simplesmente não faz nenhum sentido e teria inúmeras outras opções melhores.

É porque, acima de tudo, é de uma arrogância tremenda. A bonita chegou a dizer, numa entrevista, que não se importou com as críticas porque não se importa em agradar.

Espera aí, como assim uma artista, que vive de audiência, diz que não se importa em agradar? Será que ela entende, de verdade, do mercado em que está inserida? Ou ela acha que o público tem mais é que engolir qualquer merda mesmo?

Esse tipo de postura me faz pegar (mais) ranço de um artista. Eu acho, acima de tudo, inadmissível que essa gente se considere tão acima do bem e do mal que se ache no direito de socar qualquer porcaria goela abaixo e dane-se. A meu ver, isso é desrespeitoso com o público.

Aí alguém vai dizer "ué, mas quem não gosta é só não ouvir". Realmente, tem muita coisa no mercado e eu posso escolher não ouvir. Mas não muda o que eu penso e acabei de dizer sobre a postura da artista. Principalmente de alguém que não criou nada, apenas meteu uma letra porca em cima da música de outra pessoa.

Ah, mas será que, para me contradizer, essa maldita música vai fazer sucesso? Com certeza vai. Mas popularidade nem sempre é sinônimo de qualidade, e no Brasil nós sabemos muito bem disso.

A única coisa boa que saiu dessa história foram os memes. Por mim, podiam cancelar a música e deixar só os memes. E tenho dito.




Bom, gente, foi isso. Teve de tudo: lista de tópicos, nota de rodapé, gif animado, legendas nas figuras, post ao estilo dos primeiros e post ao estilo dos primeiros mesmo. Espero que vocês - e os autores convidados - tenham se divertido tanto quanto eu. E até o próximo mês temático!
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domingo, 19 de maio de 2019

Escrito por em 19.5.19 com 0 comentários

Nicolas Cage

Hoje seguiremos com o Mês dos Convidados, durante o qual eu descanso e meus amigos escrevem os posts. Hoje o convidado é alguém que eu conheço há mais de vinte anos, que contribuiu muito nos tempos do BLOGuil, mesmo não sendo um dos colunistas oficiais, e que eu acho uma pena que não tenhamos mais um contato tão próximo. Felizmente, a internet existe para isso mesmo - quem disse que a internet afasta as pessoas não poderia estar mais errado. Hoje é dia de Nachsieben no átomo!




Primeiramente, gostaria de dizer que me sinto honrado de ser um dos convidados do mês a poder participar com uma publicação, mesmo não tendo tantos assuntos interessantes ou sendo um primor como escritor. Creio que devo pedir desculpas aos leitores habituais por não conseguir produzir um conteúdo no mesmo nível que o autor e dono deste espaço, mas garanto que empenhei bastante esforços pensando em agradar tanto aos leitores, quanto o autor. E, sendo assim, resolvi iniciar seguindo o estilo que observo dos textos daqui, começando por descrever brevemente o que me levou a escolher este assunto.

Na fase de avaliação de possíveis temas, cheguei a pensar em talvez aproveitar o texto da minha dissertação. Isso seria com a ideia de poupar trabalho e o tempo, afinal, já teria bastante material escrito e com isso pouparia tempo... Mas ficaria um texto com linguagem muito formal, e sobre um assunto provavelmente muito pouco interessante. Outra coisa que pensei foi em talvez reciclar um dos textos da época em que arriscava em publicar em um blog. Mas os textos já não eram lá essas coisas na época, e além disso, acho que ia destoar demais com a proposta do blog.

Não lembro exatamente qual foi o motivo que me levou ao tópico que acabei escolhendo, sendo que provavelmente foi algum filme que passou e me chamou a atenção (acho que foi a participação dele em Homem-Aranha no Aranhaverso). Mas também acho que ajudou que, após ter pensado na possibilidade de escrever sobre ele, teve um vídeo do canal Wisecrack. Como o título da publicação já entregou, resolvi falar sobre Nicolas Cage!

Nicolas Cage não é o meu ator favorito, e nem sei se eu chego a ter um. Na mesma medida, não existe nenhum ator ou atriz que eu saiba estar participando de um filme e me faça automaticamente querer assisti-lo. Mas dificilmente eu assisto algum filme em que ele participe e que eu saia decepcionado. Claro, não posso dizer isso com tanta propriedade uma vez que devo ter, assistido a, no máximo, uma dúzia e meia de filmes nos quais ele atua, de uma lista de mais de 90.

Mas então, sobre o Nicolas Cage, acho que primeiro convém mencionar, para aqueles que nunca ouviram essa história (provavelmente, não estão acessando tanto assim o blog), que esse não é seu nome de batismo, mas sim artístico. Seu nome de batismo (expressão que me faz divergir mais do que faço com este breve comentário) é Nicolas Kim Coppola. Ele é sobrinho do diretor Francis Ford Coppola, mas por algum motivo não optou por usar o nome famoso para seguir a carreira artística.

Dispensar um atributo que, por não ter relação com nenhum mérito próprio, mas que lhe daria vantagem no meio, já começa a contar positivamente pra mim. A identificação como fã de quadrinhos facilita mais ainda o processo de simpatizar com o sujeito. Se bem que talvez ele seja fã demais, afinal ele chegou ao ponto de chamar o filho de Kal-el.

Uma das suas inspirações no início de carreira foi James Dean. Segundo conta, foi a atuação de James Dean que o levou a querer ser ator. Tendo interesse em atuar desde cedo, foi aproximadamente aos quinze anos que ele convenceu seu tio a participar de um teste.

A lista de filmes em que ele atuou, como já mencionei, é extensa. Ele é vencedor de um Oscar pela atuação em Despedida em Las Vegas, de 1995. Também foi indicado ao prêmio por Adaptação, de 2003. O primeiro eu não vi, o segundo eu vi e gostei, só não vi nada que chamasse a atenção a ponto de concorrer ao prêmio. Fico imaginando se foi por ele ter interpretado dois personagens com personalidades distintas, quem sabe.

A maioria dos filmes onde ele atuou e que foram bem sucedidos financeiramente estavam no gênero de ação / aventura. Um dos filmes de maior bilheteria em que atuou até hoje, A Lenda do Tesouro Perdido, tem Nicolas Cage interpretando um historiador excêntrico em uma aventura para encontrar tesouros escondidos pelos Fundadores dos Estados Unidos. Outros sucessos de ação incluem A Rocha, em que Cage interpreta um jovem especialista em armas químicas do FBI chamado para lidar com uma ameaça terrorista, e a A Outra Face, de John Woo, onde ele faz o papel tanto do herói quanto do vilão (de certa forma).

Cage é conhecido pela sua personalidade nervosa e intensa e por sua paixão pelo método de atuação, isto é, sua atuação um tanto quanto exagerada. Ele já declarou que se trata de um método de atuação próprio, que chamou de "Xamânico Nouveau". Também já se referiu a este estilo de atuação com termos tais como "expressionista alemão" ou "kabuki ocidental". Alguns chegam a criticar o exagero desmerecendo Cage como um ator. Outros descrevem isso como sendo espetacular, uma vez que ele não se limita a reproduzir o mesmo estilo de atuação ao qual estamos habituados nos filmes.

Claro que muito mais poderia ser dito de uma personalidade que tanto vem produzindo e inovando ao longo dos anos. Pela sua fama, não é difícil encontrar informações sobre sua vida pessoal desde a infância, sobre sua vida e relacionamentos afetivos e sobre vários dos projetos em que ele participou. Como qualquer pessoa, também tem suas falhas e momentos em que cometeu erros, e são conhecidos episódios sobre problemas legais e financeiros.

Mesmo com isso, para mim é alguém admirável, por ser alguém que dá para perceber que ele é um cara que não tem medo de correr riscos ao fazer o que gosta, e isso se traduz no sucesso que alcançou em na sua carreira. Mesmo parecendo excêntrico, e sem dúvidas em vários momentos "demais", esse investimento de forma tão completa nos personagens faz com que transpareça, para quem assiste, que não seja meramente a interpretação de uma emoção. São raros os artistas que parecem conseguir, como Cage, que quando ele interpreta ele consiga trazer para a obra algo tipo um estado emocional dos personagens, usando o que parece ser a busca por recordações físicas ou psicológicas destes.
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domingo, 12 de maio de 2019

Escrito por em 12.5.19 com 0 comentários

Bob's Burgers

Se você não passou por aqui semana passada, saiba que está rolando o Mês dos Convidados, no qual quatro amigos meus escolheram os temas e escreveram os posts, com o único trabalho que eu tive sendo o de colocar no ar. E o de escrever essas introduções.

A convidada de hoje é uma das minhas amigas mais queridas. Alguns de vocês a conhecem como a Penny Lane do BLOGuil, e, se for o caso, também conhecem a qualidade dos seus textos. Confesso que ela me surpreendeu no tema, mas gostei muito da escolha. Sem mais delongas, hoje é dia de Louise Araujo no átomo!





Desde que o Guil me convidou para contribuir aqui no átomo eu fiquei tentando imaginar sobre o que eu poderia escrever. Tem muitos assuntos que me interessam, mas será que interessam a outros? Ou pior: será que eu posso escrever algo que não vá ser repetitivo - mais do mesmo sobre um assunto que todo mundo conhece?

Aos 45 do segundo tempo veio a ideia: falar um pouquinho sobre uma animação que ganhou meu coração recentemente. Guil, obrigada por me dar a oportunidade de pregar a palavra de Bob's Burgers para que mais gente possa conhecer essa família maluca e divertidíssima. Espero que gostem. :)



O algoritmo do Pinterest é o meu melhor amigo e eu posso provar.

Porque foi através das sugestões dele que eu comecei a ver imagens de uma menina de visual fofo e acompanhada de frases como "Não gostei da sua falta de sarcasmo" e "Eu sinto cheiro de medo em você". E como se isso já não fosse bom o bastante, essa menina ainda se chamava Louise. Agora eu TINHA de saber do que se tratava, porque não é todo dia que aparece um personagem legal com o meu nome.


E assim eu cheguei em Bob's Burgers, uma série de animação da FOX sobre os Belchers - o patriarca Bob, a esposa mutcho loca Linda e os três filhos do casal: Tina, uma adolescente ingênua (mas cheia de hormônios); Gene, o divertidíssimo filho do meio; e Louise, a cruel, manipuladora e adorável caçula. A família comanda uma lanchonete - vem daí o nome da série - onde o carro-chefe são os hambúrgueres. Apesar de ser um cozinheiro de mão cheia e criar sanduíches diferentes todos os dias, Bob é um desastre como administrador, e a família não é muito melhor nas suas funções.

"Listen, you’re my children and I love you, but you’re all terrible at what you do here and I feel like I should tell you. I’d fire all of you if I could" - Bob faz esse discurso inspirador logo no início do primeiro episódio


O resultado, como era de se esperar, é que eles estão sempre mal das pernas financeiramente. E isso cria ainda mais empatia com os personagens: eles estão muito mais próximos de uma família real do que outras séries de animação como Os Simpsons, American Dad ou Uma Família da Pesada (curiosamente, todas também exibidas pela FOX).

Loren Bouchard, criador da série, explica que "desde o início, nós sabíamos o que queríamos em Bob's Burgers: contar histórias em que os Belchers conseguissem pequenas vitórias". Os personagens não vivem nada muito fora do ordinário; são gente comum, com algumas derrotas e essas pequenas vitórias que todos temos no dia a dia. Mesmo sabendo que ficção (e mais ainda animação) não tem nenhuma obrigação de ser uma cópia da realidade, é muito satisfatório ver que dá para se divertir muito com as histórias de alguém que poderia ser nosso vizinho.

Olha que alegria: Bob e família vão chegar aos cinemas em 2020. O projeto do filme - e a data de estreia - foram mantidos pela Disney após a aquisição da FOX ser oficializada


Outro trunfo é o time de dubladores, em especial o elenco principal. H. Jon Benjamim (Bob), John Roberts (Linda), Dan Mintz (Tina), Eugene Mirman (Gene) e Kristen Schaal (Louise) são excelentes e conseguem uma dinâmica sensacional - ajuda muito o fato de gravarem sempre ao mesmo tempo, em vez de separadamente. Aliás, vale a pena procurar no YouTube vídeos dos cinco (com o auxílio luxuoso de Larry Murphy, que empresta a voz a Teddy) improvisando um episódio ou fazendo leituras ao vivo, diante de uma plateia.

Uma coisa que eu adoro na dublagem de Bob's Burgers é ver homens fazendo algumas das vozes femininas (Linda e Tina, por exemplo) e mulheres como vozes masculinas (caso das irmãs Laura e Sarah Silverman, que interpretam os gêmeos Andy e Ollie Pesto - dois dos meus personagens coadjuvantes favoritos). Chega a ser engraçado assistir a vídeos dos atores fazendo a dublagem, porque muito rapidamente a gente aceita aquelas vozes como sendo de um gênero diferente.

Elenco em uma das leituras ao vivo de um roteiro de "Bob's Burgers". Reparem na Kristen Schaal com as orelhinhas da Louise!


Aí você, que leu até aqui, pensa "Nossa, parece tão legal! Quero muito assistir, comofas?". Bom, temos uma boa e uma má notícia. A má é que, no Brasil, só dá para acompanhar a série na tv se você assinar o FX - o canal exibe reprises em alguns horários, mas fico devendo mais informações porque o site deles é muito, muito ruim para pesquisar.

A boa notícia é que, com uma conexão à internet e algum domínio de inglês, dá para ver os episódios online em alguns sites. Eu tenho usado o WatchCartoonOnline, que tem um catálogo bem amplo de animes e animações; mesmo que você não tenha se interessado em maratonar as 9 temporadas de Bob's Burgers, com certeza vai encontrar lá algo bacana de assistir. E para quem achou minha excelente sugestão a melhor ideia desde o pão fatiado, este é o link que te leva direto à página da série (dica de ouro: dá para baixar os episódios no computador de casa ou do trabalho, jogar pro celular e ver no ônibus ou metrô sem gastar o 4G).
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domingo, 5 de maio de 2019

Escrito por em 5.5.19 com 0 comentários

Tree and Leaf (Árvore e Folha)

Nos primeiros anos do átomo, eu tinha a mania de fazer "meses temáticos". Como o próprio nome sugere, eu escolhia um mês qualquer e, nele, todos os quatro posts teriam o mesmo tema. Ao contrário do que possa parecer, entretanto, não era nada do tipo "quatro posts sobre cinema" ou "quatro posts sobre música", e sim coisas mais esotéricas como o Mês das Coisas que Eu Não Gosto Tanto Assim, com quatro posts sobre assuntos dois quais eu gostava, mas não tanto assim, e o Mês de Completar Meu Perfil - criado porque um os primeiros templates usados no átomo tinham uma coluna lateral chamada Perfil, no qual eu listava várias coisas das quais eu gostava, divididas por categorias, e, ao ver que ainda não tinha falado sobre algumas delas, resolvi inventar esse mês temático.

O tempo passou e, por motivos vários, eu abandonei os meses temáticos. Mas, ano passado, resolvi, meio que do nada, fazer um Mês do Brasil, somente com temas ligados ao nosso país, e acabei ficando com vontade de ressuscitá-los. Acabei decidindo que faria pelo menos um mês temático por ano, e, pouco depois, tive uma ideia bastante legal: o Mês dos Convidados. Durante um mês inteiro, eu terei uma folga de meus deveres de escritor, e vocês serão contemplados com quatro posts de alta qualidade escritos por amigos meus - cujos temas foram escolhidos por eles, juro que não interferi. Para começar, hoje é dia de Vinícius Cordeiro no átomo! Divirtam-se!




Eu conheço o Gui há 25 anos. Lembro até hoje como nos conhecemos, conversando antes de uma aula de desenho técnico no CEFET/RJ nos idos de 1994. Foram bons tempos, quando encontrei um grupo de pessoas com gostos parecidos com o meu, inclusive na literatura, com grande predominância da literatura fantástica muito por conta da predileção por RPG que tínhamos na época.

Em 1995 a editora Martins Fontes trouxe para o Brasil a primeira tradução autorizada de O Senhor dos Anéis (a tradução anterior é pirata, feita na década de 1970 pela editora Artenova). No final de 1997, início de 1998, eu finalmente pude comprar os três livros e desde então eu leio O Senhor dos Anéis em média uma vez por ano. Óbvio que com o tempo eu comecei a catar outros livros do professor J.R.R. Tolkien para ler e me aprofundar cada vez mais na Terra-média, com todos os seus mitos e estórias.

Porém, escolher o assunto para o post de hoje foi um tanto complicado: o Gui já escreveu sobre Tolkien, O Senhor dos Anéis, O Hobbit, O Silmarillion, e até mesmo sobre o Contos Inacabados e Roverandom, os principais livros publicados da obra do professor. Porém, ainda há um monte de livros ficcionais que o Gui pode falar sobre (As Aventuras de Tom Bombadil, Mestre Gil de Ham, Ferreiro de Bosque Grande, As Cartas de Papai Noel, etc.), isso sem falar nos livros acadêmicos-literários (Sir Gawain and the Green Knight, Finn and Hengest, A Queda de Arthur, etc.), nos livros editados por Christopher Tolkien (The History of Middle-earth, The Children of Húrin, Beren and Lúthien, The Fall of Gondolin, etc.) e por outras pessoas (The Story of Kullervo, The Lay of Aotrou and Itroun, etc.), então assunto para o átomo é que não falta. :)

Mas o livro sobre o qual irei escrever hoje é uma mescla de texto acadêmico e literário: trata-se de Tree and Leaf, uma coletânea de vários textos que giram em torno do desejo de Tolkien em justificar seu interesse pelas estórias de fadas. Sem mais delongas, vamos a ele!



Tree and Leaf é uma coletânea de textos mais antigos de Tolkien, tendo sido publicado pela primeira vez em 1964. Na forma como é impresso atualmente ele contém:
  • o ensaio acadêmico On Fairy-Stories (publicado originalmente em 1947);
  • o conto alegórico Leaf by Niggle (publicado originalmente em 1945);
  • o poema Mythopoeia (que foi adicionado nas edições publicadas depois de 1988 e escrito em 1931); e,
  • o poema épico em métrica aliterativa anglo-saxã The Homecoming of Beorhtnoth Beorhthelm’s Son (publicado originalmente em 1953), que foi adicionado por último.

On Fairy-Stories foi originalmente escrito para a apresentação de uma palestra da série Andrew Lang, na Universidade de St. Andrews, Escócia, em 8 de março de 1939. É, em suma, a justificativa acadêmica de Tolkien para toda a sua obra (nesta época Tolkien já estava escrevendo O Senhor dos Anéis há cerca de dois anos). É um texto com uma estrutura radial, como uma teia de aranha de ideias relacionadas, mas que não derivam necessariamente uma da outra. Nele, Tolkien busca corrigir uma série de equívocos a respeito das estórias de fadas, em especial os cometidos pelos estudos de filologia e mitologia comparadas. Ele afirma que se passou tempo demais usando-se estórias de fadas e mitos como fontes de informação da antiguidade, e tempo de menos considerando-se a importância e o papel das estórias como estórias, como narrativas que parecem brotar de um impulso humano primordial: o impulso para criar o que Tolkien chamou de Mundos Secundários, para lidar com a Fantasia.

Tolkien mostra que não alimentava ilusões com o suposto papel salvador do progresso e da tecnologia: como veterano da 1ª Guerra Mundial e pai de rapazes que lutaram na 2ª Guerra Mundial, ele conhecia muito bem a destruição que a tecnologia trazia junto consigo. Em sua opinião, a escravização tecnológica da natureza pode ter como subproduto a escravização do próprio homem. Daí a importância da fantasia e do que ele chamou de "sub-criação", pois com o seu auxílio podemos fugir dessa armadilha, deixando de ser escravos ou tiranos da natureza para nos tornarmos amantes dela.

Mythopoeia é o par de On Fairy-Stories, tendo inclusive uma estrofe inteira citada no ensaio. Traduzindo do grego, mythopoeia (μυθοποιία) quer dizer "o fazer dos mitos", e foi escrito por Tolkien após uma discussão em 19 de setembro de 1931 com dois amigos dele, ambos membros do hoje lendário grupo informal de discussão literária chamado The Inklings: Hugo Dyson e C. S. Lewis (sim, o autor das Crônicas de Nárnia). O poema basicamente resume as ideias de On Fairy-Stories em forma poética, sendo um poema-programa, importante não só em si mesmo, mas principalmente pelo projeto literário que representa.

A história de Leaf by Niggle se entrelaça não só com os demais textos de Tree and Leaf mas também com a da obra-prima tolkieniana, O Senhor dos Anéis. Escrito no final dos anos 1930, o conto é um dos trabalhos mais autobiográficos de Tolkien, refletindo a ansiedade que acompanhava a criação da Saga do Anel e o que o autor via então como sua incapacidade de concluir o universo ficcional com o qual sonhava e no qual trabalhava desde a juventude. Quando a história tomou forma, conta Tolkien no prefácio original de Tree and Leaf, os hobbits Frodo, Sam, Merry e Pippin (que então nem esses nomes tinham ainda) haviam apenas começado sua jornada para Valfenda. O escritor simplesmente não sabia como a trama continuaria a partir dali.

O conto narra a história de Niggle, um pintor não muito organizado que vive perdendo tempo com detalhes e incômodos menores sem conseguir concluir a obra de sua vida. Isso reflete o próprio Tolkien, que em sua tentativa de criar uma mitologia para a Inglaterra, compulsivamente reescrevia detalhes que qualquer outra pessoa julgaria irrelevantes. Toda a obra de Tolkien ocuparia facilmente dezenas de volumes, mas muito desse material nunca foi impresso durante sua vida exatamente por causa desse excesso de perfeccionismo.

Por fim, temos o provavelmente único texto em forma dramática escrito por Tolkien, The Homecoming of Beorhtnoth Beorhthelm’s Son. Trata-se de uma possível continuação de um poema do fim do período anglo-saxão (algo entre o fim do século X e o início do século XI) conhecido como A Batalha de Maldon, que é um fragmento sem começo nem conclusão com 325 linhas.

O poema é escrito em métrica aliterativa anglo-saxã, que é uma forma bastante diferente da tradição poética ocidental tal como a conhecemos hoje. Explicando de forma muito simplista, cada frase é dividida em duas "meias-frases", e entre elas há a "rima" de determinados fonemas seguindo regras bem restritas. Um exemplo em inglês pode ser mais útil para ilustrar isso (a aliteração está marcada com consoantes em negrito):

Here! Lend a hand! This head we know!
O lord beloved, where do you lie tonight
Was like words whispered by waking ghosts


É uma forma de poesia bem complexa e já obsoleta na Inglaterra na Idade Média, mais semelhante à "construção em pedra" do que com a composição musical, usando uma analogia feita pelo jornalista Reinaldo José Lopes.



Este livro possui duas edições comerciais publicadas no Brasil. A primeira é de 2006, publicada pela Editora Conrad sob o título Sobre Histórias de Fadas; já a segunda foi publicada em 2013 pela Editora Martins Fontes, usando a tradução literal como título: Árvore e Folha. Ambas as edições foram traduzidas por Ronald Kyrmse, o brasileiro especialista em Tolkien revisor de suas obras aqui no Brasil desde meados dos anos 1990.

Destas duas eu li apenas a edição da Conrad, que possui uma tradução bastante problemática: o texto flutua entre o excessivamente domesticador e o extremamente literal. Tratando-se de textos de um autor que era antes de tudo um filólogo, que deliberadamente fazia escolhas de palavras extremamente significativas do ponto de vista filológico, esta tradução deixou muito a desejar. Pelo que pesquisei, a tradução feita para a Martins Fontes foi aprimorada, mas não tenho como comprovar isso.

Mas existe uma terceira alternativa.

Em agosto de 2006, o jornalista Reinaldo José Lopes apresentou uma tradução de Tree and Leaf como dissertação de mestrado ao Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos e Literários em Inglês da USP. Como até aquela data o livro não estava disponível comercialmente no Brasil em português, a dissertação não fere nenhum direito autoral.

Uma curiosidade é que somente nesta dissertação é que temos, mesmo que de forma incompleta, uma tradução do poema The Homecoming of Beorhtnoth Beorhthelm’s Son: segundo Reinaldo, a combinação da imensa dificuldade em usar as regras da aliteração em português com o curto prazo que dispunha para entregar a dissertação impediram que ele terminasse a tradução deste poema. O link é este aqui.

Considerando-se que os direitos de publicação das obras do professor Tolkien em nosso país passaram da Editora Martins Fontes para a Editora Harper Collins Brasil, que prometeu retraduzir toda a obra já publicada no país, além da tradução de textos inéditos, podemos esperar que este livro receba atenção renovada num futuro próximo. E quem sabe usem a tradução do próprio Reinaldo como base, já que ele foi contratado pela editora para ser o responsável pela tradução de alguns dos livros: a versão nacional de A Queda de Gondolin e a nova tradução de O Silmarillion foram feitas por ele, que também está responsável pela nova tradução de O Hobbit.



† Cabe ressaltar que esse é um dos raríssimos textos alegóricos de Tolkien. Como escrito no prefácio de O Senhor dos Anéis, Tolkien tinha um desgosto pela alegoria, por achar que ela viola a liberdade do leitor em interpretar uma estória pelo seu próprio ponto de vista, ao ser conduzido a uma interpretação específica direcionada pelo escritor.

(Texto originalmente publicado no falecido blog Livre-se!, adaptado e expandido para o átomo)
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